Publicação investiga como o coronavírus SARS-CoV-2 se replica no trato intestinal
Estudar uma doença nova é um processo de ganho de conhecimento que vem aos poucos, e envolve a exploração de muitas hipóteses ou abordagens. Por exemplo, embora o patógeno novo afete com maior especificidade um determinado tecido ou órgão, investigar apresentações atípicas que envolvam outros órgãos do corpo é importante para entender fenômenos e sintomas tidos como incomuns, mas que podem ser de grande importância para a saúde das pessoas afetadas e/ou para o espalhamento viral. No caso do SARS-CoV-2, a replicação e inflamação no epitélio respiratório é a mais estudada, e responsável pelo quadro de saúde grave que leva à maior parte das internações e óbitos, mas existem evidências de que o vírus está presente no trato gastrointestinal e pode se espalhar no ambiente também através das fezes.
O artigo aqui resumido teve objetivo primário de identificar se amostras de swab retal podem conter o genoma do SARS-CoV-2, assim como partículas virais viáveis, capazes de causar infecção. As amostras foram coletadas de pacientes sintomáticos e contactantes, dos quais também foram coletadas amostras de saliva e swabs de nasofaringe como controle. Além de buscar por uma sequência de RNA indicativa da replicação viral, a equipe de pesquisa testou a presença de partículas viáveis nas amostras pela observação dos chamados “efeitos citopatogênicos” em cultura de células — ou seja, as modificações nas células em cultura causadas pela infecção, que podem ser observadas em microscópio. Ao todo, entre as amostras retais, nasofaríngeas e de saliva, foram coletadas 1633 amostras entre Maio e Outubro de 2020, na cidade do Rio de Janeiro. Das 31 amostras de fezes de pessoas com teste positivo, 6 (19,4%, ou quase um quinto das amostras) tiveram evidência da replicação viral, pela detecção de RNA mensageiro indicativo da replicação. Apenas uma amostra de swab retal foi capaz de gerar efeitos citopatogênicos observáveis, o que indica que provavelmente a via fecal de infecção é rara na dinâmica epidêmica. Apesar disto, a evidência de replicação e da possibilidade de infecção a partir do trato gastrointestinal é importante, pois acrescenta um pouco mais de conhecimento sobre esta virose ainda pouco compreendida.
Ribeiro IP, Nascimento LGd, Tort LFL, Pereira EC, Menezes LSR, Malta FC, Oliveira BCEPDd, Rodrigues JP, Manso PPdA, Pelajo M, et al. Infectious SARS-CoV-2 Particles from Rectal Swab Samples from COVID-19 Patients in Brazil. Viruses. 2023; 15(5):1152.