Relato de caso atípico de COVID-19 persistente em paciente vacinada argumenta em favor da revisão continuada dos esquemas de vacinação
Uma questão importante após o surgimento e combate de uma nova doença, causada por um patógeno com o qual a espécie humana não possui uma história de longo prazo, é a constante avaliação e refinamento de imunizantes, uma vez que o sistema imunológico nem sempre é capaz de gerar uma resposta efetiva de longo prazo a cada patógeno. Isto se dá, em geral, por vários fatores, como a própria dinâmica do sistema imunológico, características inerentes das moléculas-alvo de anticorpos (também chamadas de antígenos), que podem não levar a uma memória imunológica de longo prazo, e também porque os patógenos continuam evoluindo — podendo fixar em suas populações mutações que levem a um escape da resposta imunológica por resultarem em antígenos com estruturas diferentes.
Em publicação recente, um grupo de pesquisa vinculado à Rede Genômica Fiocruz no Ceará descreveu o caso de uma paciente brasileira jovem e sem comorbidades que, apesar de esquema vacinal completo com duas doses mais uma terceira dose de reforço (em outubro de 2021), foi acometida por um caso de COVID-19 com um tempo de replicação do vírus um pouco mais longo que o usual. A paciente é uma profissional de saúde e teve resultados positivos para a presença do RNA viral em amostras de orofaringe por até 40 dias após o início dos sintomas (ou seja, entre julho e agosto de 2022). O artigo avalia, além da quantidade estimada de RNA viral ao longo destes 40 dias, algumas características da resposta imunológica da paciente, como a contagem de anticorpos do tipo IgG no soro durante o período, bem como anticorpos que se ligam a alguns antígenos específicos, como a proteína do nucleocapsídeo, que indicam uma infecção ativa ou recente.
Segundo os resultados descritos no artigo, a infecção persistente após três doses do imunizante pode ter se dado tanto por uma queda na capacidade de resposta rápida mediada por anticorpos quanto pelo fato de a linhagem responsável pela infecção (a Ômicron BA.5.1) apresentar em seu genoma uma ampla constelação de mutações em relação às linhagens do início da pandemia do SARS-CoV-2, utilizadas para a confecção das vacinas utilizadas no Brasil até 2022.
Vasconcelos, G. S., Fernandes, M. D. C. R., Matsui, T. C., dos Santos Luciano, M. C., Costa, C. L., Ferraz, C. P. M., … & Fonseca, M. H. G. (2023). Persistent SARS-COV-2 infection in vaccinated individual with three doses of COVID-19 vaccine. Vaccine, 41(11), 1778-1782.